quarta-feira, junho 30, 2004

Não podemos papar tudo o que nos aparece à frente

Sem cair em tentação, os últimos acontecimentos políticos em Portugal são propícios a clivagens ou ao reforço das mesmas. A saída brusca, mas não súbita, de Durão Barroso foi o corolário de uma forma de estar e de fazer política que, em muito faz de Durão Barroso, seu representante e mestre. Não se pode deixar de evidenciar que, Durão Barroso, apesar de ter sido a 4ª escolha para o cargo que irá assumir, não deixou de se insuflar e de ver esta nomeação como a oportunidade de se ver livre de um governo que o iria crucificar, por mera retaliação, pelo que este tem vindo a fazer ao país. Não se pode esquecer do discurso de posse do ex-primeiro-ministro que disse que o país estava de tanga e que reforçou a necessidade de reformas, que não se viram, por via do facto do País estar de tanga.
Quando se apela à Esquerda unida para fazer frente à suposta hípotese de nomear Pedro Santana Lopes, é importante referir que, a Esquerda, sempre teve unida no propósito de fazer valer os direitos e as garantias dos cidadãos na Democracia, enferma que temos no nosso país, mas que existe e quer-se mais forte. As formas e os propósitos, de cada um dos partidos de esquerda podem divergir entre si mas, convergem determinantemente na busca, incessante, da democracia plena em que o diálogo e o escutar as apreensões do povo são determinantes práticas das políticas desses partidos. Mas, como disse já, é necessário não cair em clivagens latentes por diferenças políticas, que são óbvias, mas que no fundo pretendem, ou deveriam, atingir a prosperidade e segurança de uma sociedade livre e Democrática, esquerda ou direita. Digo isto apenas porque na Direita, apesar de raros,existem exemplos de democracia como é exemplo Freitas do Amaral ( vide carta aberta publicada no jornal Público de 28/06/2004).
As eleições antecipadas são o espectro mais que provável para o futuro político em Portugal, resta saber se serão em Setembro, Outubro ou Novembro. No entanto, é importante referir que as eleições antecipadas não são a única novidade. Enquanto nos digladiamos entre aqueles que pretendem permanecer nos seus cargos e os outros que pretendem a democracia plena em acção, o Sr. Durão Barroso, deixou-nos um legado que se vai repercutir no futuro e que trará profundos inconvenientes ao nosso futuro e ao futuro da Europa. A nova Constituição Europeia, já assinada e rectificada pelo Governo em Salónica, vai trazer uma forma de condução política impregnada nos ideais da Direita Conservadora Cristã por via de dois factos. O primeiro tem a ver com a rectificação que o Governo, ou melhor, ex-governo, fez do tratado que rectificou o texto da Constituição, e, em segundo lugar, o facto de termos, actualmente, uma maioria no Parlamento Europeu do Partido Popular Europeu. Não é necessário uma análise muito aturada para compreender que, através do que foi a reunião da NATO em Istambul, a política externa europeia, fundamentada e apoiada na Nova Constituição, vai privilegiar o combate ao terrorismo sob as premissas que têm vindo a conduzir o conflito no Iraque, ou seja, mesmo que no seio da Europa possam surgir vozes contra um conflito análogo ao do Iraque, os países europeus que pretenderem, mesmo assim, violar os princípios que deverão nortear a nova Europa, e a Democracia em geral, bem como o Direito Internacional, podem-no fazer porque dispõem do direito a veto de decisões que digam respeito à política externa de cada um dos países membros. Mais, Portugal, apesar de ter uma Lei que penaliza o Aborto, nunca poderá ver essa Lei contrariada por via do facto de que a Nova Constituição prevê que cada Estado Membro tenha o direito de reservar a sua legislação para o respeito dos seus usos e costumes, e após a assinatura da Concordata com o Vaticano, pode-se adivinhar que os usos e os costumes em Portugal, em matéria da despenalização do aborto, são católicos, ortodoxos e violadores de princípios básicos da liberdade e do Estado de Direito.
Esta será a primeira de várias rubricas onde procurarei explanar os prós e os contras de uma Constituição que irá a referendo sem que tenha havido qualquer tipo de debate para a organização dos princípios básicos que irão nortear uma tão necessária e imprescindível Constituição Europeia. Por último, resta-me referir que apenas 30% da população portuguesa se afirma como sendo católica praticante, porque os restantes, divididos por outras confissões religiosas, são ao que parece católicos culturais. Não me vejo numa missa católica como quem vai a uma peça de teatro mas enfim.

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