quinta-feira, novembro 18, 2004

Guerra

As imagens divulgadas na televisão mostrando um soldado Norte-Americano a alvejar, mortalmente, um iraquiano ferido, chocou muita gente. No entanto, isso não é chocante se formos a analisar a questão a fundo. A lógica da guerra, se é que esta existe, ou se existe é num campo metafísico onde tudo, mas mesmo tudo, é relativo, prevê este tipo de acções como legítima. É como se nos despíssemos de todos os valores que norteiam uma qualquer sociedade e nos atirássemos de cabeça nas mais básicas e cruéis leis da sobrevivência onde partilhamos uma espécie de esquizofrenia “inteligível� onde o conflito entre a personalidade de predador e da de presa se confundem num só autómato que cumpre as regras impostas por outros e tenta sobreviver. Não sei o que passou na cabeça daquele soldado Norte-Americano quando alvejou o outro soldado iraquiano mas, quase de certeza, não produziu qualquer tipo de pensamento inteligível, apenas funcionou, eliminou o que poderia ser uma ameaça. Não pretendo desculpabilizar o acto cometido pelo soldado Norte-Americano mas sim tentar ver como é possível e quão imprevisível é um ser humano quando colocado numa situação extrema de stress.
Numa situação de guerra as nossas acções futuras são imprevisíveis, nunca saberemos até onde poderemos ir, ou o que seremos capazes de fazer, é animalesco. A responsabilidade maior nestas situações é de quem faz a guerra, de quem a promove, quem a executa, salvas as excepções, funciona e tenta sobreviver como pode, exponenciando tudo o que de bom e mau tem, é mais forte do que cada um.
O cérebro humano funciona a 27 % , mais ou menos, de sua capacidade, o resto é ocupado pelo subconsciente que, por si, é um mundo de gravações efectuadas ao longo da vida. Por vezes, em sonhos, é-nos revelado medo, ânsia, desejos e outras sensações. Acordamos pensando que é um sonho ou que é algo irreal mas, por vezes, não é. Na cabeça de cada um daqueles que actualmente vivem no meio da guerra do Iraque, ficaram com o seu subconsciente gravado com mais episódios medos, ânsias e coisas boas muito poucas. Quem ordena ou promove a guerra, geralmente, não é sujeito a estas gravações sequer.
Em Portugal, apesar de insistentemente ser ocultado ou ignorado, temos ainda muitos casos de ex-combatentes com sintomas de stress de guerra. Nada é documentado, nem são mostrados o ex-combatentes ainda internados no Hospital Militar com complicações graves do foro psicológico que vegetam desde o dia em que foram desmobilizados e já lá vão mais de trinta anos em alguns casos. Dá-se, a uma geração sacrificada, 150 Euros por mês, pelos anos perdidos de suas vidas naquela guerra sem sentido.
Não inventei nada de novo com este post eu sei, nem quis reinventar aqui a roda, no entanto, acho muito importante relembrar sempre isto. Numa altura em que se fala tanto em questões de segurança e a necessidade de ver as forças armadas apetrechadas com meios bélicos capazes de neutralizar essa “ameaça�, a verdadeira ameaça continua a existir no provocar ou não da guerra. As políticas externas utilizadas pelos diversos países, onde incluo Portugal, infelizmente, dão azo a que essa lógica animal da guerra floresça e ganhe força. É um animal que se deve ter enjaulado mas não ignorado, a guerra, não é uma entidade externa à condição humana, como não é o ódio, faz parte de cada um de nós mas temos que ter consciência disso e saber enfrentar esse problema.

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