quarta-feira, abril 06, 2005

Diz-me o que ouves que eu dir-te-ei quem tu és

Diz-me o que ouves que eu dir-te-ei quem tu és. Parece um pouco excessiva a utilização desta expressão mas vem a propósito de algo que eu tenho vindo a lembrar-me. Esta ideia surgiu quando desencantei da minha prateleira um CD dos Depeche Mode, mais propriamente o álbum “Ultra�, e nessa altura, algo fez clique na minha cabeça de uma forma diferente do que outrora quando ouvi pela primeira vez este álbum. Para mim cada CD tem a sua história, a sua alma, não aquela que os próprios autores pretendiam mas sim a minha, sem querer desvirtuar a obra.
O álbum dos Depeche Mode “ Violator� foi o meu primeiro álbum dos Depeche Mode em formato CD que eu adquiri. Sempre gostei de música electrónica e Depeche Mode despertou em mim algo diferente. A Tânea, minha colega de turma, partilhava comigo a devoção por Depeche Mode e o irmão mais novo dela, coitado dele, nem sabia o que o esperava. Pois é rapaz tiveste que gramar com Depeche Mode até começares a gostar. Recordo-me que, numa aula de Inglês, eu e a Tânea, fizemos um trabalho de grupo sobre o álbum Violator dos Depeche Mode, foi a desculpa mais esfarrapada para ouvir e partilhar a música de Depeche Mode para as demais criancinhas naturais com quem partilhávamos a turma. Ninguém conhecia Depeche e, por algum motivo estranho agora mas lógico na altura, ficámos orgulhosos, trouxemos a luz ao obscurantismo musical vivido pelos restantes colegas de turma, ou seja, mostrámos que havia algo mais do que a cassete de House Music que se ouvia nos carrinhos de choque ou aquele grupo da altura absolutamente detestável, os Bros.
Sex Pistols, The Clash, All That Petrol Emotion e outros sons Punk encheram horas intermináveis do meu quotidiano musical numa altura posterior a Depeche Mode e já numa fase rebelde da minha parte. Nesta fase dou destaque a dois álbuns e duas almas diferentes. UHF e The Mission encetaram um ciclo muito rico para mim. Foram os tempos do Vidal e das intermináveis horas à frente de litrosas de cerveja, uma guitarra e muitos ideiais, muito crescer, muito viver. Cantávamos, quem sabia é claro, UHF, Zeca Afonso, Xutos e Pontapés entre outros grupos da altura e marcávamos assim o compasso da contestação política a que nos devotámos na altura. Foram tempos mágicos aqueles que eu vivi no Vidal, um café pequeno, numa pequena Vila, num universo imenso que se me abria ali mesmo ao meu alcance. Foi nessa altura que um amigo meu e o restante grupo, numa passagem de ano, conheceu uma personagem enigmática. De uma carrinha do Pão saiu uma personagem que se aproximou do Carlitos e lhe ofereceu um relógio dizendo: “… Eu sou o dono do espaço e do tempo…� desde então o Carlitos é o guardião do Espaço e do Tempo. Não há cá anéis para ninguém, é um relógio dos chineses. O Carlitos é o Senhor do Relógio.
Posso falar acerca de muitos outros álbuns e as almas que eu criei para cada um deles mas estaríamos aqui até sempre. Robert Whyatt, The Cure, Hedningarda, Dead Can Dance, Kraftwerk, David Bowie, Minimal Compacts, Zeca Afonso, José Mário Branco, Sérgio Godinho entre muitos outros elevaram a minha percepção sobre várias coisas e, acima de tudo, foram catalizadores dos meus sentimentos, naves espaciais numa viagem a galáxias distantes. A capacidade de nos emocionarmos com a música, de perceber a sua fragilidade, a sua subtileza, o seu poder é a expressão mais sublime do que é sentir e ser capaz de transmitir e receber.

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